O novo Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) que entrou em vigor no passado dia 4 Março, está a criar muitas expectativas, algumas das quais erradas. As expectativas justificam-se, porque abrem a possibilidade de impedir que os processos fiquem na Câmara por tempos ilimitados. O RJUE foi feito para facilitar a vida do Dono da Obra, e menos a das Câmaras, mas para os Requerentes nem tudo são rosas. Uma das principais questões prende-se com a contagem dos prazos. Porque são curtos para a Câmara mas também são curtos para o Requerente


A Lei é confusa de se ler, mas é fácil de se aplicar. Importante é saber que a Câmara deixa de poder emitir ofícios sucessivos, sempre a pedir coisas novas. Só as pode pedir por uma única vez, em cada fase.

Há no exemplo que vou dar, um Requerente que deseja fazer uma obra. Faz um requerimento a pedi-lo, e anexa um conjunto de documentos entre os quais um projecto de arquitectura. O RJUE diz que a deliberação tem que ser tomada 30 dias depois deste requerimento inicial. Mas a Câmara tem 15 dias para olhar para o processo e ver se está bem instruído, ou se falta algum documento.

Ao fim destes 15 dias, das duas uma. Ou é produzido um ofício para aperfeiçoamento do pedido ou ele está omisso. Caso esteja omisso, é porque o processo está bem instruído, e nunca mais pode ser feito o pedido de aperfeiçoamento do mesmo. Salvo excepções devidamente tipificadas, por exemplo como consequência da consulta externa. Mas se a Câmara produzir ofício de aperfeiçoamento, dá 15 dias para a resposta. E há 3 hipóteses, ou o aperfeiçoamento é feito em 10 dias e os prazos não suspendem, (ou seja, mantêm-se os 30 dias para a decisão final) ou demora 15 dias, e um novo prazo de 30 dias começa a contar a partir desse dia. Ou não é dada qualquer resposta, e o processo caduca automaticamente. Em abono da verdade esta fase é rara de acontecer, também porque a plataforma geralmente bloqueia se não forem entregues todos os documentos. Mas caso caduque automaticamente, então o processo tem que ser reintroduzido, com a repetição do pagamento das taxas.

Nos restantes 5 ou 30 dias (depende da celeridade da resposta anterior) a Câmara tem de saber se há entidades externas que têm de se pronunciar, como por exemplo na Orla Costeira, no Património ou outras. E no caso positivo, tem 30 dias para pedir, receber e notificar o requerente. Em abono da verdade esta fase também não é corrente. E se não for preciso fazer consultas externas, continua a valer os 30 dias após o requerimento inicial.

O RJUE diz que Câmara tem de fazer a deliberação final dentro dos 30 dias, a menos que decida fazer um pedido de audiência a interessados. E esta fase é o trunfo dos burocratas, até porque um excesso de deferimentos tácitos prejudica a avaliação do funcionário. Esta audiência visa a correcção de desconformidades com normas, ou planos existentes, ou decisões anteriores. Mas o RJUE diz que a deliberação sobre o processo tem que ser tomada 30 dias depois de, ou do requerimento inicial, ou do saneamento, ou da resposta externa vinculativa. E não refere a audiência aos interessados.

Quer isto dizer que uma vez dada a resposta à audiência dos interessados, e não podendo haver outros pedidos, então o processo termina aí, e dá lugar à deliberação final. Desde que a resposta não demore mais tempo que entre 120 e 200 dias (depende da área) que é o limite pré-estabelecido.

Habituados à aplicação negligente da lei, é natural que o munícipe se pergunte como pode reclamar os seus direitos no caso de 1. se a Câmara não enviar os ofícios devidos ou 2. se os enviar fora dos prazos legais ou 3. se extravasar as suas competências e começar a pedir coisas que não pode ou 4. se repetir o mesmo procedimento mais que uma vez, ou 5. se não emitir as taxas devidas.

Se existir a plataforma eletrónica, ela emite a deliberação final (que pode ser positiva ou negativa), ou emite em alternativa o deferimento tácito, ou a caducidade do processo. Mas se bem conheço a nossa Câmara, para já ela não vai incluir esse procedimento na plataforma, o que quer dizer que tem de ser pedida uma certidão de deferimento tácito. Essa certidão pode ser pedida na plataforma e.gov.pt.

Finda a apreciação da arquitectura, o Requerente tem 6 meses para entregar as especialidades e a Câmara diz quais são. Tem que dizer quais são, porque na Lei não há a figura de apreciação dos projetos de especialidade, nem o respectivo pedido de aperfeiçoamento dos mesmos.

Vítor Grenha
Arquitecto