Publicou o JMG, na sua última edição, um texto sobre o PSD, sendo eu, na qualidade de membro demissionário da Comissão Política local, objeto natural da notícia.

No essencial, os factos correspondem à verdade e não me merecem qualquer comentário, considerando que as opiniões expendidas no próprio texto seguem a linha editorial do jornal e comprometem o jornal e o autor da notícia. Tudo normal, mas a justificar uma reflexão que quero partilhar com os leitores.

Se é verdade que o jornal cumpriu a sua função de informar, não é menos verdade que “alguém” lhe passou a informação, com a agravante da mesma ter fluído apenas num grupo restrito de pessoas, às quais se destinava. Não sendo plausível admitir o acesso ilegítimo (e ilegal) à correspondência informática, não restarão muitas dúvidas que, sob a forma de calhandreirice, “alguém” a quem a correspondência era dirigida a facultou a terceiros, neste caso ao próprio “JMG”. 

É esta uma situação invulgar no seio de um partido político e, neste caso, do PSD? Não, com a frequência que acontece é uma situação que poderíamos rotular de normal. E é, sobretudo, esta normalidade que merece aqui uma reflexão um pouco alongada.

No contexto do distrito de Leiria, o concelho da Marinha Grande tem vindo a perder visibilidade e influência, sob diversos ângulos de análise – urbanístico, cultural, político e institucional. É, desde há anos, um concelho voltado para si próprio, envolvido numa teia cúmplice de calhandreirices, alimentando fatos, personagens e acontecimentos sobre os quais se especula numa miríade de nomes e cenários construídos sem ingenuidade por parte de quem os alimenta.

É verdade que tem/temos uma realidade económica que nos deve gratificar, mas isso só prova uma coisa simples de constatar – temos na Marinha Grande uma plêiade de empresários e gestores bem mais válida e competente do que os políticos e seus cinzentos “ajudantes de campo”.

Daqui resulta uma conclusão óbvia – para manter o protagonismo que não dispensam, os “ajudantes de campo” prestam-se a (quase) tudo, conspirando para que nada ou quase nada mude nas instituições políticas. Afinal, é aqui onde se tomam decisões que podem valer milhões, se arranjam empregos muito convenientes, se protegem amigos e vilipendiam inimigos, se fazem negócios “oportunos”, se tecem teias de interesses sob o manto enganador da ideologia. E, como se percebe, não faltam protagonistas que, sem ideias próprias, se dispõem a assumir as ideias dos outros, como contrapartida da sua eleição.

Romper com este círculo vicioso (e viciado) de “ajudantes de campo” que, por si ou por terceiros, apostam tudo na confusão e na intriga, é uma questão vital num partido político, como acontece com o PSD.

Percebe-se porquê – integrando reiteradamente os órgãos autárquicos (especialmente a Assembleia e o Executivo Municipal) o partido é solidariamente responsável pelo estado de definhamento do concelho e pela sua letargia institucional. Não tem sabido, querido ou não o têm deixado (…) assumir-se com determinação, autonomia e lucidez como alternativa ou fiel de uma balança ideologicamente formatada. Muito ativos e com as Autárquicas já no horizonte, alguns “ajudantes de campo” apostam em minar qualquer esforço para inverter e alterar esta realidade, condicionando projetos e estratégias, entretendo-se a cogitar nomes que, uma vez eleitos, se vêem entregues à sua sorte, num exercício autofágico só compreensível pelos interesses em jogo e pelas pessoas que deles beneficiam.

Dir-se-á que esta postura conspirativa não é exclusiva de um partido político, nem reside apenas na Marinha Grande - o mesmo se vem passando noutras organizações – futebolísticas, culturais, económicas. Basta que lhes cheire a poder ou a dinheiro e não faltam por aí pessoas capazes de vergarem a cerviz alegremente, ao peso dos interesses, seus ou de terceiros.
E onde ficam os interesses dum concelho, como a Marinha Grande, sabendo-se da importância que têm as suas instituições políticas e a forma mais ou menos organizada como funcionam? A resposta não é difícil – quantos desses políticos “acinzentados” e dos seus acólitos, estão preocupados com os interesses do concelho, com os seus projetos, o seu futuro, o futuro dos mais novos, afinal dos seus próprios filhos?

É aqui onde a bota não bate com a perdigota. Sem instituições organizadas e capazes de pensar para além dos interesses de alguns dos seus elementos, o concelho não é capaz de refletir sobre os seus reais problemas e desafios e vai definhando lentamente, como tem vindo a acontecer. É um concelho com um corpo saudável (empresários e gestores), mas com uma cabeça doente (políticos, “ajudantes de campo”, transfugas comunicacionais). É, não se duvide, um concelho onde não vão regressar muitos dos filhos dos que agora se entretêm nesta espécie de jogos florais de poder. Por isso e, contrariando uma frase que por cá fez escola na década de 90, uma terra onde (não) apetece viver!

Se olharmos para a evolução política da Marinha Grande ao longo destas quatro décadas, depressa constataremos que não é apenas o PSD que tem estado sujeito a um definhamento local. De eleição para eleição, os restantes partidos do “arco do poder local” têm encontrado crescentes dificuldades em mobilizar pessoas válidas que queiram emprestar o melhor do seu saber, da sua experiência e das suas competências aos diversos órgãos do município e das suas freguesias. Não surpreende que assim seja – em ambiente de crescente intriga, acabrunhante fulanização e, por vezes, violência verbal sectária e desenfreada, poucas são as pessoas válidas que queiram dar o corpo ao manifesto nos órgãos autárquicos. Restam os mesmos do costume, os que seguem a mesma linha de sempre – é preciso criar a ilusão de que alguma coisa vai mudar para que tudo fique na mesma!
Vai o PSD conseguir ultrapassar uma situação que lhe é endógena e arreigada no tempo? Não faço ideia, nem faço profissões de fé, tão pouco me atrevo a procurar adivinhar as cartas do viciado jogo político local. Posso adivinhar, isso sim, que os problemas que desafiam o PSD nas próximas Autárquicas são os mesmos que confrontam os restantes partidos e movimentos concorrentes – a dificuldade em convencer os melhores a integrar as listas.
É bom que compreendamos o que está em causa – se persistirmos neste ambiente de conspiração, intriga e guerrilha permanente, podemos prometer o impossível, criar redes de interesses, ganhar eleições, mas não teremos os melhores nos lugares autárquicos. E sem os melhores restam os medíocres e, não se duvide, a Marinha Grande vai continuar a definhar, sem projetos realistas de futuro, adiando soluções para os muitos problemas que tem pela frente. Dito de outra forma – não é uma questão de ganhar ou perder eleições, é uma questão de motivar os melhores para participar nas eleições. Se não for conseguido esse desiderato, cava-se o fosso entre a importância económica do concelho e a (falta de) importância das suas elites políticas, culturais e sociais.

Impõe-se uma questão final – vão as próximas Autárquicas iniciar um novo caminho na Marinha Grande? Tenho dúvidas, mas também tenho a esperança que isso possa acontecer. Depende de todos. E, claro, também do PSD…

Fernando Lopes