Durante uma semana, 31 alunos dos 8.º e 9.º anos do Agrupamento de Escolas de Vieira de Leiria trocaram as aulas pela participação na Academia Ubuntu. A iniciativa decorreu nas instalações da Junta de Freguesia, onde o JMG assistiu ao encerramento das atividades e à entrega de diplomas

 

Foram cinco dias repletos de dinâmicas que incentivaram os jovens à reflexão, à compreensão do outro, à partilha de experiências, sentimentos e histórias de vida. “Ser uma melhor pessoa” foi uma expectativa partilhada por diversos participantes logo no início da semana. No final do segundo dia, e de acordo com as mensagens escritas pelos próprios alunos, esteve em evidência o tema da empatia. “Saber pormo-nos no lugar do outro” e “Para realizar os nossos sonhos não precisamos destruir os dos outros” foram algumas das ideias partilhadas, de forma anónima, no final. Os alunos foram ainda desafiados a dar sugestões de melhoria relativamente à escola e ao espaço que a rodeia.

Ao JMG, Alexandre Santos e Marina Lopes, técnicos especializados em Educação Social e Mediação Escolar do Agrupamento, explicaram que o principal objetivo da Semana Ubuntu foi trabalhar competências pessoais e sociais dos alunos, bem como “deixar uma semente de mais confiança, empatia e contributo para a comunidade”.

Segundo os responsáveis, o trabalho foi desenvolvido com base nos cinco pilares da metodologia Ubuntu, designadamente o autoconhecimento, a autoconfiança, a resiliência, a empatia e o serviço. “Acreditamos que no final desta semana vamos ter aqui jovens líderes, dispostos a mudar para melhor a nossa escola e a nossa comunidade”.

E o que levam os alunos desta experiência?, quisemos saber. “Eles saem daqui com um melhor conhecimento deles próprios. Havia alguns com muito pouca confiança e que fugiam da exposição oral, e durante esta semana vimos a sua capacidade de reflexão e de argumentação aumentar substancialmente”, explicou Alexandre Santos.

Os técnicos realçaram ainda os benefícios ao nível da interação com os outros e do trabalho em equipa, reforçados com as diferentes dinâmicas implementadas.

Fazer das dificuldades, forças

A diretora do Agrupamento de Escolas de Vieira de Leiria adiantou ao JMG que aderiu ao projeto por considerar “bastante importante trabalhar emoções e sentimentos, aquilo que às vezes se faz pouco na escola, e tínhamos alguns problemas”.

Lígia Pedrosa explica que em todas as escolas há problemas de comportamento dos alunos, que alguns têm dificuldades de integração ou estão a viver momentos difíceis na sua vida de que a escola não tem conhecimento. “Considerámos que este projeto poderia ser uma forma de conseguirmos que estas dificuldades que vamos sentindo pudessem ser apaziguadas”, referiu a responsável, que recebeu “excelente feedback” dos participantes. “Vai ser muito importante o testemunho destes alunos para depois, dentro da escola, as coisas irem mudando”, referiu Lígia Pedrosa.

A diretora coloca a possibilidade de voltar a realizar a semana Ubuntu no próximo ano letivo, assim os técnicos responsáveis pela sua dinamização junto dos alunos se mantenham ao serviço na escola, e destaca as mais-valias deste tipo de projetos. “O aluno que esteja bem consigo próprio aprende muito melhor e tem outra perspetiva, e acho que é muito importante trabalharmos a parte emocional”, concluiu a diretora do Agrupamento de Vieira de Leiria.

Mas afinal, o que é isso do «Ubuntu»?

«Ubuntu» significa “Eu sou porque tu és”. É uma filosofia de vida africana, que impele cada um a “tornar-se pessoa”, evidenciando que a natureza humana tem no seu centro a relação com o outro. A Semana Ubuntu é um projeto desenvolvido pelo Instituto Padre António Vieira no âmbito da Academia de Líderes Ubuntu – Escolas, ao qual os estabelecimentos de ensino podem aderir, como foi o caso do Agrupamento de Vieira de Leiria, que pretende agora dar corpo a um Clube Ubuntu no seu seio, disseminando as dinâmicas realizadas e ampliando, desta forma, o seu impacto na comunidade escolar.

“Toda a gente tem valor”

Nair Gomes, aluna do 8.º ano, considerou a semana “divertida” e realçou o facto de ter aprendido “coisas novas”, e ter feito novas amizades e experiências. A aluna de 14 anos assume que no início da semana estava “entusiasmada” e no final leva ensinamentos importantes: “não devemos julgar os outros sem os conhecer, e toda a gente tem valor”.

Santiago Marques, do 9.º ano, que trazia “expectativas altas e muita curiosidade” quanto ao projeto diz ter “gostado muito” dos resultados. “Saio daqui com a mensagem de que devemos respeitar os outros e não julgar ninguém”. Habitualmente pouco participativo, Santiago, de 14 anos, garante que tentará mudar a partir de agora a sua postura em contexto de sala de aula. Para tal, contribuiu a troca de experiências com colegas da escola que não conhecia e com os quais não se relacionava.

Quem não estava muito interessada em participar na semana Ubuntu com receio de perder matéria importante nas disciplinas era Sofia Magalhães, aluna do 9.º ano. “Esta semana surpreendeu-me pela positiva, foi uma experiência inesquecível que vou levar para o resto da vida”, revelou ao JMG. A estudante, de 14 anos, contou que o que mais a marcou foi o facto de ter conseguido partilhar assuntos só seus, pela primeira vez, com terceiros. “Percebi que há mais pessoas a sofrer e algumas com os mesmos problemas que nós e que, no fundo, somos todos iguais”. Embora não tenha estudado Português ou Matemática durante aqueles dias, Sofia aprendeu outras coisas. Desde logo, a valorizar o trabalho de equipa, e a nunca desistir de tentar alcançar um objetivo por mais difícil que ele possa ser. Refira-se que, no que respeita às matérias, nada ficará por aprender já que esse foi um aspeto acautelado pelos professores dos alunos participantes.

Já Lucas Corte, por sua vez, confessou ao nosso jornal que aceitou participar nas atividades por ter visto ali uma forma de “escapar às aulas”. Contudo, esse objetivo caiu por terra logo no primeiro dia. “Mudei de opinião. Acho que é uma iniciativa muito boa, os técnicos são muito profissionais e as dinâmicas propostas marcaram-me muito”. O aluno do 9.º ano, de 14 anos, destaca o dia de terça feira em que o desafio colocado era defender o seu sonho dos restantes colegas. O problema é que o sonho estava materializado num balão, que todos podiam tentar rebentar a qualquer momento… No final, o balanço não poderia ser mais positivo. “Aprendi muitas coisas novas, desde a importância da escuta ativa, a autoconfiança, o autoconhecimento, a empatia e o serviço para com os outros”.

“Sem dúvida, uma experiência a repetir”, consideraram os alunos com quem o JMG falou.

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